quinta-feira, 26 de março de 2009

O carro que completa você

Na mitologia grega, Eros é, ao mesmo tempo, uma das energias primordiais, geradora da união do Céu e da Terra, e o aparente inofensivo Cupido, o filho maroto de Afrodite, a grande Deusa do amor. O mito de Eros une o universal e o singular, encarna o sublime amor e o fogo da paixão, resolve o problema da gênese no mundo. É energia de ligação do Cosmos com os seres vivos. Em suas flechas, esconde o poder sobre o desejo, a fantasia, o impulso erótico.

Ainda na mitologia grega, Eros é amor, é falta, insuficiência, necessidade e, ao mesmo tempo, desejo de conquistar o que não se possui. Recorrendo ao antigo diálogo O Banquete, de Platão, percebemos que esse desejo pode ser associado ao belo, ao desejo do belo ou ainda ao desejo de vencer a morte. Nesse textos a personagem Aristófanes, um dos convidados do banquete, narra a história da natureza humana e suas vicissitudes. Segundo a personagem, antes do surgimento de Eros, eram três os gêneros na humanidade: o masculino, o feminino e o andrógino, sendo este último um ser distinto dos outros dois. O andrógeno tinha forma inteiriça, arredondada, quatro mãos, quatro pernas e quatro orelhas, uma cabeça com dois rostos opostos sob um pescoço e dois sexos. O gênero masculino era descendente do sol, o feminino da terra, de onde se reproduzia, e aquele que tinha ambos, da lua. Castigados por Zeus e os demais deuses, por terem-nos desafiados, os seres andróginos foram cortados ao meio como conta o discurso de Arisfófanes: “eu os cortarei a cada um em dois, e ao mesmo tempo eles serão mais fracos e também mais úteis para nós, pelo fato de se terem tornado mais numerosos; e andarão eretos, sobre duas pernas” (PLATÃO, 2003 : 120). Por conseguinte, essa natureza humana passou, então, a procurar sua metade para se unir a ela, no ardor de se fundirem, formando a completude da vida.

A idéia de tornar o homem completo por meio da aquisição de mercadorias foi usada no comercial do carro Pálio 2010. Vejamos o filme:

O filme mostra um personagem que não consegue mais conviver com a sua alma, que tem interesses muito distintos do seu corpo.

O único momento em que corpo e alma se unem é diante do Novo Palio, um carro com biparábola, direção hidraulica e aero fófio de serie e motores mais potentes. A assinatura da campanha que tem também mídia impressa é "O carro que completa voce".

O homem busca, incessantemente, tornar-se completo por meio de objetos adequados, que ele mesmo escolhe pelo processo de identificação. Depois da aquisição ele entra num estado que chamamos de gozo e em seguida torna-se incompleto novamente, e reiniciar sua busca. 
A criação é de Paulo Areas e Tomas Correa com direção de criação de Ruy Lindenberg.

O preço da sedução

O mundo da publicidade introduz o consumidor num universo imaginário, estabelecendo seus próprios valores estéticos em busca da persuasão. Assistimos a discursos cuja finalidade é regular, a seu modo, o poder de compra das pessoas. A sociedade parece querer se consumir, movida por um impulso incontrolável de autofagia; consumimos a nós mesmos na busca de satisfazer a irreprimível e incontrolável necessidade de compra.

Na batalha pela conquista de consumidores, a publicidade articula linguagens carregadas de diferentes apelos com um fim único: seduzir o consumidor. Nos enunciados de comunicação, verificamos um tipo de apelo que se repete em inúmeros anúncios publicitários, o apelo sexual, que nos chama a atenção neste momento, em virtude de sua ampla exposição às diferentes mídias e por fazer parte da propaganda dos inúmeros itens de consumo. Afinal, o poder econômico do consumidor é visto nos símbolos sexuais adquiridos por ele, representando marcas e produtos. Ou seja, o sexo é um porta-voz do poder e do prazer.

O sexo está no consciente e no inconsciente dos indivíduos, e é por isso que também é encontrado no coração da mídia. Vemos uma infinidade de publicações sobre sexo disponíveis em editoriais de revistas e jornais nas bancas. Esses editoriais tratam de assuntos como táticas de conquista, estereótipos masculinos e femininos, o que nos permite imaginar homens e mulheres em busca do poder, da conquista, da sedução. Não seria estes, ingredientes básicos para se chegar a uma relação sexual.

Inauguramos esse blog com o intuito de investigar mais detalhadamente os sintomas dos indivíduos nesta sociedade capitalista do século XXI. Acreditamos na importância de pesquisas nessa área tanto do ponto de vista publicitário, que como tal julga necessário submeter um olhar perspicaz sobre a sociedade de consumo e o mercado, quanto para as questões da humanidade, adentrando nas suas vontades e nos seus desejos não manifestados exteriormente, desencadeando sintomas que fazem do consumidor alvo fácil para as empresas. Afinal, o consumidor é o centro de todo o esforço publicitário, e muitos estão dispostos a grandes sacrifícios para encontrar o prazer que lhes falta.

COSTA, Patrícia Martins Costa. O Preço da Sedução. In Sexo na Propaganda. Disponível em http://www.sexonapropaganda.blogspot.com.